Desaponto com a primeira medida de impacto

Por Cesar Vanucci *

“Está comprovado que mais armas é igual a mais crimes.”

(Natália Pollachi, coordenadora do Instituto “Soudapaz”)

 Externamos com sincera convicção a opinião de que o governo Bolsonaro laborou em estrondoso equívoco ao anunciar a sua primeira grande decisão de impacto popular. Desperdiçou parcela apreciável do alentado crédito de confiança que se lhe foi assegurado pela coletividade. Coletividade essa que se mostra ávida por ver concretizadas as transformações essenciais prometidas na campanha eleitoral com vistas à construção de um país melhor para se viver. O equívoco se configura na promulgação do decreto concernente ao que se convencionou denominar de flexibilização do comércio de armas.

A medida soa clamorosamente como um retrocesso. Não como conquista humanitária. Notório seu caráter populista. Faltou sensibilidade social e engenho político. Mais: faltou sintonia com o genuíno sentimento das ruas, ao se optar por essa decisão ruidosa, de desbordante anacronismo. O governo, sabemos bem, desfruta de considerável dose de credibilidade. Acena com estilo de administrar inovador e diferenciado, comprometido com o amanhã, não com o trasanteontem das coisas. Isso tudo favorece a conclusão de que a medida divulgada, carente de inspiração, foi de molde a trazer desaponto.

A repercussão negativa vem sendo reconhecida pela quase unanimidade dos órgãos de comunicação social, como reflexo do estado de ânimo popular. A atitude assumida foi, no ver de muita gente, uma aposta enganosa. Ou seja, uma avaliação totalmente incorreta dos fatos. É falso o pressuposto de que a liberação de armas de fogo confere condições favoráveis aos cidadãos de se defenderem da violência abominada pela sociedade. A opinião pública, pelo que se observa, discorda frontalmente da interpretação oficial. Os índices de rejeição da proposta são significativos. Os argumentos que apontam o caráter temerário da resolução são bastante convincentes.

Dentre as avolumadas críticas vindas à tona, nascidas das perspectivas dramáticas que a liberação engendra, levando-se em conta ainda a circunstância de que nosso país ostenta, deploravelmente, a condição de recordista mundial em matéria de assassinatos produzidos por armas de fogo, figura o alarmante e justificado receio de que a facilidade oferecida na compra de armas acabe por reforçar as ações nefastas do crime organizado. Não é preciso muita elucubração mental para supor que a bandidagem se aparelhará, rapidamente, diante da chamada “flexibilização”, no sentido de “legalizar” as aquisições de “produtos” que venham a ampliar seus arsenais clandestinos.

 Lado outro, não fica difícil a previsão de que uma maior quantidade de armas em disponibilidade nos lares atraia, ainda mais, o “apetite” dos assaltantes, abrindo-se possibilidades indesejáveis de que os apetrechos adquiridos pretensamente para defesa pessoal acabem indo parar nas mãos de facções criminosas. São a perder de vista os argumentos que se contrapõem à ideia de se carrear, para as inexperientes mãos de cidadãos inseridos em rotina pacífica de vida, armas com as quais possam eles, suposta e falsamente, se proteger de malfeitores. E, ipso facto, até se arvorando em integrantes de uma espécie de força-tarefa complementar dos contingentes policiais legalmente constituídos. Contingentes aos quais é atribuída institucionalmente a importante missão de promover ações de prevenção e combate a grupos e pessoas que perturbem a ordem constituída e ameacem o sossego público.

 As autoridades governamentais bem que poderiam, diante da reação desfavorável produzida pelo decreto, proceder a uma reavaliação serena das expectativas, carregadas de esperança, que povoam a alma popular. Isso lhes proporcionará, por certo, a revelação de que as mudanças prioritárias almejadas estão bem distantes do apelidado “decreto faroeste”. O foco das aspirações gerais são providências que anunciem a retomada do desenvolvimento econômico, a abertura de frentes de trabalho, por aí. De modo tal  que permita ao país invadir o futuro de grandeza que a história lhe reserva em razão de suas inigualáveis potencialidades e virtualidades humanas e naturais.

 * O jornalista Cesar Vanucci (cantonius1@yahoo.com.br) é colaborador do blog Mundo Afora.

Artigo de 24/01/2019

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