Do inferno na Líbia à Cavalgada de Reis na Catalunha

Vinte cinco refugiados líbios resgatados no Mediterrâneo participarão da Cavalgada de Reis no município de Reus. Um deles encarnará o rei Baltasar, que pela primeira vez não será interpretado por um branco pintado de negro 

Refugiados libios nos galpões onde estão as indumentárias para a Festa de Reis

A tradicional Cavalgada de Reis do município de Reus, na Catalunha, terá pela primeira vez um negro encarnando o Rei Baltasar. Em edições anteriores da festa, o intérprete pintava o rosto para representar o monarca que veio da África para reverenciar o menino Jesus. O personagem será vivenciado por um dos refugiados líbios resgatados em junho pela ONG Open Arms. Na encenação, terá a companhia de outras pessoas que foram resgatadas na mesma época e foram acolhidos pelo município pela Comissão Catalã de Ajuda ao Refugiado (CEAR), que atuarão como pajens do comboio.

A inclusão dos refugiados no espetáculo acontece depois de uma campanha lançada pelo movimento Casa Nostra, Casa Vostra (Casa Nossa, Casa Vossa) e o partido Candidatura de Unidade Popular (CUP), pedindo às prefeituras catalãs que as cavalgadas contassem com um “Baltasar de verdade”. Outros municípios também atenderam ao pedido. Na Catalunha, o Dia de Reis é feriado e celebrado com muita festa. A maioria das cidades realiza gigantescas cavalgadas que são assitidas por milhares de pessoas. Na data, as crianças recebem presentes e as famílias celebram o final do ciclo natalino. 

Na cavalgada de Reus participarão 25 refugiados, dos quais um será o rei, cinco interpretarão pagens e 19 acompanharão a carroça real que abre o cortejo. Betcha Honorée e Souleyman Barry são dois dos acolhidos que participarão do espetáculo. Eles foram resgatados em junho quando se aventuram no mar Mediterrâneo para chegar à Europa num grupo de 60 pessoas, que teve o desembarque proibido na Itália e em Malta. Finalmente, foram transportados a Barcelona em julho.

Betcha Honorée foi resgatado em junho pelo barco Aquarius com um grupo de 60 pessoas no Mediterrâneo

Na ocasião, ao poderem dormir em uma cama depois de meses, os dois expressaram agradecimento. “Quero agradecer a Barcelona e a Catalunha. Isso é muito forte”, frisou Betcha Honorée. “Naquele momento, todos gritaram, choraram. Eu chorei e agradeci a Deus por chegar no paraíso”, relembra Souleyman Barry. A alegria se deve ao fato de terem conseguido sobreviver a um verdadeiro inferno na Lñibia, onde milhares de pessoas tentam atravessar o país para chegar à Europa. Grande parte paga fortunas para sair de países como Nigéria, Mali ou Gana, sendo que muitos acabam em centros de detenção ou vendidos como escravos.

Souleyman Barry relata que chorou quando colocou os pés na Catalunha,onde foi acolhido após o resgate

A princípio foram acolhidos na residência esportiva Blume, na região de Esplugues de Llobregat, onde passaram o verão. Depois, seguiram para o centro de acolhida do CEAR, em Reus, onde vivem atualmente. No local, estudam idiomas e realizam cursos profissionalizantes para que possam se integrar ao mercado laboral. O trabalho na Cavalgada de Reis se deve a um convênio entre a entidade e a prefeitura da cidade. Com isso, a entidade dá curso ao trabalho de inclusão das pessoas refugiadas à cidade e estimula a participação na vida comunitária.

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