O futuro é aqui
Por Cesar Vanucci *
“O Brasil permanece o Brasil.”
(Domenico de Masi, sociólogo de renome mundial)
Domenico de Masi, o nome dele. Sociólogo italiano de renome universal, não esconde a paixão pelo Brasil. Manifesta tal sentimento, outra vez mais, num depoimento dado em Roma a Roberto D’Ávila. Abra-se parêntesis para anotar que o competente entrevistador citado sobressai-se, em relação a inúmeros colegas de profissão, pela circunstância de saber conduzir sua tarefa sem importunar o interlocutor, deixando-o à vontade para expressar livremente as ideias. Na entrevista divulgada pela “Globo News”, Masi recoloca a tese sustentada no livro “O futuro chegou – modelos de vida para uma sociedade desorientada”.
E de que tese está mesmo a falar, com convicto fervor, o consagrado pensador? Perpassando, em meticulosa análise estendida por oitocentas páginas pelos sistemas de convivência social que mais acentuadamente marcaram a história nestes dois mil e quinze anos da era cristã, Domenico focaliza quinze modelos socioeconômicos e religiosos testados pela humanidade. Batiza-os com títulos que enfatizam traços peculiares da essência de cada um.
Estes os modelos apontados: 1. O modelo indiano – Humanismo espiritual; 2. O modelo chinês – Grandeza composta; 3. O modelo japonês – O refinamento do guerreiro; 4. O modelo clássico – Equilíbrio e beleza; 5. O modelo hebraico – O povo de Deus; 6. O modelo católico – A felicidade não é desta terra; 7. O modelo muçulmano – Fé e conquista; 8. O modelo protestante – Graça e rigor; 9. O modelo iluminista – Razão e progresso; 10. O modelo liberal – Mão invisível e sem preconceito; 11. O modelo industrial capitalista – Produzir para consumir; 12. O modelo industrial socialista – Reformismo, cooperação, felicidade: 13. O modelo industrial comunista – Revolução, coletivismo, terror; 14. O modelo pós-industrial – Sociedade programada e virtual; 15. O modelo brasileiro – O futuro chegou.
O estudo discorre sobre virtudes e equívocos dos modelos globais já experimentados, desembocando na conclusão de que o progresso civilizatório só pode ser medido pela qualidade de vida das pessoas. E que isso só é mesmo alcançado na plenitude com práticas de relacionamento humano ancoradas no ócio criativo, na meditação, no lazer, na contemplação da beleza, na amizade, na solidariedade e na convivência fraternal. O Brasil, por força de estupendas virtudes, entende ele, encaixa-se soberbamente num modelo ideal que a humanidade carece adotar visando a própria sobrevivência. Melhor dizendo, projeta esplendidamente esse modelo nas coisas que faz.
“Não obstante o traço colonizador da Europa e Estados Unidos, o Brasil permanece o Brasil e os aspectos originais e melhores da brasilidade continuam a prevalecer sobre os importados e negativos”, assevera o pensador. Acrescenta que os conceitos expendidos constituem a suma de estudos aprofundados de muitos anos da realidade brasileira. Masi ressalta, a propósito, que o juízo de valores assimilado derivou de valiosa contribuição trazida pela leitura das obras de intelectuais brasileiros, por ele classificados como pensadores de vanguarda no mundo contemporâneo. São citados, entre vários outros, Gilberto Freire, Euclides da Cunha, Sérgio Buarque de Holanda, Cristovam Buarque, Caio Prado Junior, Fernando Henrique Cardoso. Darcy Ribeiro é aquinhoado pelo sociólogo italiano com especial louvação. Ele assinala que os trabalhos desse mineiro de inteligência fulgurante ajudaram-no a conhecer melhor as entranhas de nosso processo civilizatório a partir do caldeamento racial. Masi reporta-se, ainda, aos estudos de Stefan Zweig sobre a vida brasileira. Esse intelectual austríaco também encantou-se com o país, exaltando-o como “O país do futuro”. A respeito da expressão, Masi registra que, antes de Zweig, o escritor brasileiro Jorge Amado, utilizou-a abundantemente em suas criações literárias.
Domenico de Masi aposta, esperançoso, no modelo brasileiro como saída futura para os desafios de uma sociedade desorientada. Considera, no complexo estudo, que os lances culturais dominantes na vida brasileira situam-nos, entre todos os países do mundo, como o mais preparado para definir novas formas de relacionamento diante dos conflitos pós-industriais. Enaltece a circunstância de que o Brasil “nos cinco séculos de sua história europeizada, exilou seus dois imperadores, substituiu a monarquia pela República, levou ao poder ditadores e os destituiu, sempre recorrendo a grandes movimentos de rua, sem degenerar em guerra civil”. Os argumentos utilizados para fundamentar seu empolgamento com o Brasil contêm poder contaminador mais que suficiente para induzir-nos, todos nós, a promover sinceros esforços no sentido de redescobrir as potencialidades e virtualidades inseridas no dna da Nação.
Mais Domenico de Masi na sequência.
* O jornalista Cesar Vanucci (cantonius1@yahoo.com.br) é colaborador do Blog Mundo Afora.