A “Partícula de Deus”
A “Partícula de Deus” (I)
Por Cesar Vanucci *
“Temos uma máquina para dar resposta a tudo.” (Carlos Rúbio, Nobel de Física)
Afinal de contas, o que foi mesmo que a ciência já conseguiu levantar, em matéria de revelação extraordinária, na busca infatigável, em que há anos se acha empenhada, no sentido do que se convencionou denominar “Partícula de Deus”? Alguns anos atrás, neste acolhedor espaço, formulamos singelas, talvez até ingênuas, por desconhecimento de causa, especulações sobre a empolgante questão.
Suponho ser interessante repeti-las. De certo modo, elas deixam evidenciado que, nascido da inventividade e labor humanos, existe montado um aparato tecnológico complexo construído por cientistas de alto nível engajados no esforço de decifração dos enigmas, muitos deles cruéis, concernentes ao passado, presente e futuro da civilização.
Quando chegarão as respostas do que está sendo procurado? O que se vai ler a seguir são as observações deste escriba mencionadas na introdução deste texto. As observações se estenderão por três artigos. Palpite vou confessando logo, de leigo enxerido. O que realmente sei – a respeito deste como de tantos outros temas em que, costumeira e ousadamente, me animo a meter o bedelho – é que nada sei.
Fica evidenciado que a estrondosa invenção deixou os cientistas em êxtase. No desfrute do privilégio de detentores de uma senha mágica, um “abre-te sésamo” de versão tecnológica moderna que lhes permite escancarar um portal por onde supõem possa ser estabelecida fantástica conexão com um mundo repleto de revelações inimagináveis sobre a origem e o sentido da vida. Transpor esse portal significa, em sua douta avaliação, certeza de estarem a protagonizar um momento transcendente da história. Um momento em que o conhecimento provisório acumulado pela ciência, sobre coisas maravilhosas e enigmáticas que rodeiam o ser humano, está prestes a ser sacudido por atordoantes reformulações.
O superacelerador de partículas, conhecido por LHC – “Large Hadron Colider”, “Grande Colisor de Hádrons”, em tradução livre – foi esmeradamente montado, ao longo de três décadas, pela Organização Europeia de Pesquisa Nuclear. Congrega contribuições de sete mil cientistas de diferentes nacionalidades, brasileiros entre eles. Instalado num túnel de 27 quilômetros, a 120 metros abaixo do solo, na fronteira da França com a Suíça, ele começa a ser acionado com o objetivo de trazer respostas, no campo da física avançada, sobre questões fundamentais ligadas ao começo de tudo.
Seus idealizadores imaginam possível, no curso das ações projetadas, recriarem-se condições análogas aos instantes que se teriam seguido ao “Big Bang”, ou seja, à explosão fantástica apontada como a suposta fonte matricial energética da composição do universo. “Entramos numa nova era para a ciência”, assevera Robert Aymar, diretor do programa. “Demos passo fundamental para desvendar mistérios tão antigos quanto a humanidade. Na verdade, estamos em busca da própria definição de humanidade”, reforça Chris Smith, do grupo coordenador das pesquisas. Carlos Rúbio, Nobel de Física, não deixa por menos: “Praticamente 95% do que existe no universo não é conhecido por nós. Não sabemos o que é a matéria negra nem a energia negra. Pensávamos que isso jamais seria possível descobrir. Atualmente, temos uma máquina pra dar as respostas a tudo. Vamos provar que o “Big Bang” não é apenas conceito filosófico”.
Se tão transbordante euforia, compartilhada por outros expoentes na esfera acadêmica, prenuncia conquistas que poderão resultar na expansão do saber humano, é algo que só vamos ficar sabendo mais na frente. O gigantesco maquinário colocado em movimento na cata de respostas vem provocando pororoca de questionamentos. Como, aliás, sempre acontece em episódios relacionados com as descobertas. Os contestadores desenham quadro apocalíptico. Tacham a experiência de descomedida, perigosa.
Como já explicado, estas considerações terão continuidade. (Segue)
A partícula de Deus (II)
“A ousadia dos cientistas pode abrir clareiras de conhecimento em terreno espinhoso.”
(Antônio Luiz da Costa, educador)
Recapitulemos os fatos. No começo do século, cientistas da mais elevada qualificação juntaram conhecimento, criatividade e esforços numa experiência extremamente arrojada, a mais fantástica já levada a termo na história da civilização. Conceberam e implantaram num túnel subterrâneo de 27 quilômetros, entre a França e a Suíça, um superacelerador de partículas, dotado de prodigiosa capacidade para cálculos, com o inimaginável objetivo de desvendar os enigmas do universo. “Temos uma máquina para dar respostas a tudo”, assegurou, apoderado de desnorteante euforia, com forte acento utópico, o Nobel de Física Carlos Rúbio, um dos idealizadores do projeto. A experiência ficou conhecida como a busca da “Partícula de Deus”.
Na época, este escriba alinhou, numa série de artigos, algumas considerações a respeito da audaciosa iniciativa. Vários anos transcorreram sem que alguma revelação extraordinária emergisse do experimento científico. Partindo desse ponto, sublinhando que a expectativa quanto aos resultados das ações científicas em questão persistirá até que surja alguma resposta retumbante concernente às pesquisas encetadas, iniciamos, no comentário anterior, a reprodução das considerações há bom tempo aqui estampadas, levando em conta a circunstância de que continuam oferecendo frescor de atualidade.
A narrativa foi interrompida à hora em que informamos que o empreendimento recebeu contestações em alguns círculos científicos. Os contestadores alegam que o terreno palmilhado é inteiramente desconhecido, por isso, imprevisível. A energia gerada pela ebulição do equipamento poderia produzir “mini-buracos negros”, aterrorizante campo gravitacional capaz de sugar instantaneamente toda a matéria viva existente no planeta, com repercussões danosas até mesmo no sistema solar inteiro. O vaticínio catastrófico é negado veementemente pelos partidários do projeto, entre os quais o astrofísico Stephen Hawking, por muita gente considerado a maior cabeça pensante da ciência contemporânea desde Einstein, em que pesem suas notórias dificuldades para se expressar.
A colisão dos prótons, no interior da LHC, à velocidade da luz, irá desencadear tremenda onda energética, fazendo surgir partículas nunca dantes observadas e que só teriam existido, a se por fé no que garantem os cientistas, no início da formação do universo. Os 600 milhões de impactos por segundo revelariam a partícula inaugural do processo da criação, que alguns se aventuram denominar de “partícula de Deus”.
Os cientistas empenhados com fervoroso entusiasmo nessa desafiadora e complexa empreitada dizem que a tecnologia humana está sendo esticada, nesta hora, ao limite extremo. Alimentam a esperança de arrancar resposta global a questões fundamentais.
Esperar pra ver, né? A aventura humana é composta muito mais de perguntas do que de respostas. As grandes descobertas, mesmo significando triunfo sobre o que o conhecimento consolidado põe transitoriamente na conta de impossível, desencadeiam sempre novas questões, um turbilhão de interrogações, concitando os cérebros bem-dotados a redobrados exercícios de curiosidade sobre o sentido das coisas. Imagino, sem entender – confesso mais uma vez – bulhufas de física, que os resultados do experimento imporão a continuidade das buscas. Atrás de respostas. De mais respostas. Sempre mais.
Cientistas famosos andam apregoando que suas avançadas pesquisas pelas enigmáticas veredas da física quântica vêm permitindo aproximação cada vez maior da chamada “partícula de Deus”. Gabam-se mesmo de já haver encontrado pistas intrigantes da localização do “bóson de Higgs”, estrutura supostamente responsável pelas interações na Natureza. No entendimento dos doutos, embora hipotético, um elemento provido de massa que teria aparecido logo após o também hipotético “Big Bang”, apontado por círculos científicos como a primeira de todas as coisas dentro da linha conceitual adotada pra explicar a Criação. (Segue)
A Partícula de Deus (III)
“A peça que falta para o quebra-cabeças.” (Fernando Werkhaizer, físico)
Com o texto a ser lido na sequência concluo as considerações que fiz a respeito da experiência científica intitulada “Busca da partícula de Deus”. Conforme explicado nos dois artigos anteriores, estas reflexões foram redigidas e divulgadas há muitos anos. A pesquisa dos sábios ainda está em curso, mas dos resultados nada chegou ainda ao conhecimento público que possa ser traduzido como resposta grandiosa compatível com os objetivos propostos. Permanece inalterada a exclamação esperar pra ver!
Tal partícula seria responsável pela composição dos átomos. Advém dessa circunstância a denominação que se lhe foi dada de “partícula de Deus”.
Passa bem ao largo das cogitações deste desajeitado escriba, com sua supina ignorância da temática cientifica, desdenhar ou mesmo contradizer diretamente os brilhantes físicos engajados nesse salutar propósito de descobrir, pelos atalhos das exaustivas investigações cientificas, explicações sobre como começou tudo quanto está posto aí. Mas que eu duvido possa esse bem-intencionado esforço desembocar, nos prazos estipulados, nas respostas tão desejadas pelo aluvião de interrogações nascidas da compreensível inquietação humana a respeito do princípio, sentido e destino da aventura da vida, ah, isso, eu duvido mesmo, sim senhores! Como se costumava dizer, noutros tempos, de forma bem descontraída em papos coloquiais, du-vi-de-o-do.
Tanto quanto o meu restrito entendimento leigo consegue alcançar dessa fascinante procura levada avante por alguns cérebros privilegiados, com o concurso de tecnologias assombrosas, o chamado “bóson de Higgs” seria assim como uma peça que estaria faltando pra fechar o quebra-cabeças da teoria do “Big-Bang”, ou seja da explosão nuclear que formou o Universo. Não passa, como já dito, de hipótese, sujeita ainda a comprovação, de acordo com a expectativa de eminentes sábios.
Os colisores de prótons, localizados em pontos estratégicos do mundo, empregados nessa busca infatigável já estariam, a esta altura, fornecendo indícios animadores (mais do que isso, talvez, convincentes) de que uma revelação concludente estaria prestes a ser anunciada. Mas, muitos cientistas, precavidamente, não descartam a possibilidade de que o processo possa não lograr atingir, por conta de fatores imponderáveis, os resultados ardentemente almejados. O modelo da investigação poderia ter sido composto com pressupostos equivocados. Se isso de fato, contrariando tantas esperanças, acontecer, ou seja, a descoberta da partícula não puder se consumar, outros caminhos haverão de ser, obviamente, desbravados pela ciência na tentativa de achar explicações consistentes para os mistérios que circundam a infinita vastidão cósmica.
Bem, e quanto às descrenças pessoais que, simploriamente, consciente do analfabetismo cientifico que carrego, entendi de externar quanto aos resultados das investigações em curso a respeito da “partícula de Deus”, no que, afinal de contas, se fundamentam? Em mera, pura e simples intuição. Nada mais do que isso. Seria rematado tolo não reconhecesse na ciência um excepcional instrumento de procura da verdade. Uma força poderosíssima em condições de movimentar ideias e ações que se entrelaçam com o futuro e o destino da humanidade.
Mas, nada obstante os extraordinários feitos e conquistas proporcionados pela ciência, levando em conta de outra parte tantos problemas cruciais angustiantes, enfrentados pela sociedade humana destes nossos tempos – problemas cuja solução distante depende bastante das inovações tecnológicas –, penso, com meus botões, apoderado de certezas, ser ainda demasiadamente cedo, no atual estágio de desenvolvimento emocional e espiritual do ser humano, pra se conceber a possibilidade da decifração cabal do código da vida. O deslindamento dessa charada não é pra agora. Aposto e dou lambuja.
* O jornalista Cesar Vanucci (cantonius1@yahoo.com.br) é colaborador do Blog Mundo Afora