Reflexões motivadas pelo flagelo
Por Cesar Vanucci *
“O planeta ficou doente porque está com a “huma…nidade” baixa.”
(Texto colhido no youtube)
O flagelo do coronavírus está dizendo a que veio. Sacudiu, em escala planetária, as estruturas. Trouxe apreensão, temores, infortúnios. Chamou as pessoas à reflexão.
Com impactantes implicações de toda ordem, projetou no sentimento do mundo, com absoluta nitidez, a inarredável certeza de que a sociedade humana, em sua peregrinação pela pátria terrena, está a trilhar rumos frontalmente opostos aos direcionados no sentido do bem-estar social almejado pelas multidões. Refazer conceitos equivocados de vida é relevante. Reconectar o mundo com sua humanidade é imprescindível.
É preciso assegurar primazia, em tudo que se promova com vistas à exaltação da vida, aos valores humanísticos e espirituais que conferem dignidade à aventura humana. Garantir que tais valores essenciais sobrepujem, nas horas das tomadas de cruciais decisões pelas lideranças em diferentes níveis, as egoísticas e arrogantes percepções das coisas que costumam influenciar negativamente a marcha da história.
A “globalização da indiferença”, na sábia definição do Papa Francisco – “gloriosamente reinante” no reverente reconhecimento dos católicos, bem como no de muitos fiéis das diversificadas correntes religiosas – é também rotulada por homens e mulheres de boa vontade de “globalização da injustiça”. E isso devido às circunstâncias de traduzir estado de espírito que faz ouvidos moucos e desvia acintosamente o olhar aos clamores e cenas aflitivas desses conturbados tempos contemporâneos. A indiferença mais ou menos generalizada deixa flagrante a existência de mundão de gente que pouco, ou nada, se apoquenta com as tragédias coletivas que se vão acumulando a cada giro da Terra na imensidão sideral.
Nos campos da visão e da escuta de quem tem olhos para enxergar e aparelho auditivo para ouvir lá estão as constantes guerras fratricidas, a brutalidade terrorista, o desapiedado drama dos refugiados, as avassaladoras endemias que cobrem o maltratado território africano, a miséria das populações de ruas, cortiços e alagados, a contundência das desigualdades sociais, o opróbrio dos preconceitos e das discriminações regidas pelo ódio, insensatez e ignorância e numerosas outras modalidades – admita-se também epidêmicas - de extermínio da vida.
A ausência, pelo menos nas proporções desejadas, de solidariedade social, o despreparo gritante de lideranças com papel de destaque na execução de tarefas voltadas para a descoberta de caminhos que conduzam a uma jornada evolutiva da civilização pontuada de paz, harmonia e justiça são fatores que concorrem para que haja contínuas distorções dos acontecimentos. É assim que jorram tantas interpretações errôneas e nocivas desapartadas do verdadeiro sentido da vida.
Perturbadas diante do bombardeio de informações desencontradas – um volume apreciável delas falsas, com aparência de verdade –, comunidades inteiras encaram com mecânica naturalidade - e até mesmo com desconcertante banalidade - situações sumamente graves. De certo modo, apavorantes. Em sendo assim, cometem o absurdo de descartar, por exemplo, os riscos (mais do que comprovados) do chamado aquecimento global. Uma “invencionice de cientistas amalucados”, em conluio com ideólogos extremistas empenhados em espalhar confusões, conforme insistentemente proclamam porta-vozes do obscurantismo intelectual talibanista. Uma corrente de pensamento retrógrado que se espalha por aí, em tudo quanto é latitude do planeta, com impetuosidade, vale admitir, virótica…
Muitas as constatações a registrar dessa carência de senso crítico face à acumulação de lances em condições de provocar desassossego social. Bastante emblemáticos na lista desses episódios indesejáveis, os gastos bélicos colossais das grandes potências escandalizam e indignam as mentes mais conscientes. Esse impactante desperdício de recursos dá vaza a que muitos países possam armazenar instrumentos de destruição em escala potencial capaz de reduzir a fragmentos, por dezenas de vezes, tudo aquilo que as diferentes gerações plantaram na superfície do planeta desde os começos dos tempos.
Mesmo entre cidadãos tidos na conta de bem-informados, revela-se reduzido o contingente daqueles que se mostram estarrecidos e que se animam a criticar as alarmantes opções, dos donos do mundo quando desviam recursos amealhados pelo labor humano para horrendos conflitos. Cuidemos de anotar: um porta-aviões, devidamente equipado, da imensa frota que, permanentemente, singra os oceanos, em ameaçadoras vigílias, a serviço das maiores potências, cobra dos contribuintes valor superior – ora, veja, pois! - ao PIB de numerosos países.
Como é que pode? Se a dinheirama gasta dessa maneira fosse destinada, como recomenda o bom-senso, à solução de problemas relacionados com as necessidades humanas vitais, incontáveis tragédias coletivas, inclusive as produzidas por vírus de origem desconhecida, poderiam estar sendo, com certeira convicção, evitadas ou combatidas com total sucesso.
O tema, visto está, comporta infindáveis considerações.
* O jornalista Cesar Vanucci (cantonius1@yahoo.com.br) é colaborador do Blog Mundo Afora