Olhos em Madaya, cidade síria onde a guerra mata de fome. Ao menos 300 foram resgatados pela ONU
As atenções internacionais sobre os horrores da guerra na Síria estão centradas nos últimos dias em Madaya, cidade na fronteira com o Líbano, onde 42 mil pessoas estão cercadas há quase seis meses por forças do regime de Bashar al-Assad. Um comboio com ajuda humanitária, comida e medicamentos capitaneada pelo Crescente Vermelho sírio e a Cruz Vermelha conseguiu entrar ontem (11) na cidade e as notícias desta terça-feira (12) dão conta que 300 pessoas foram retiradas de lá.
Madaya teve sua triste situação exposta nas redes sociais, com famílias tentando sobreviver alimentando-se de folhas e até de cães e de gatos. A divulgação de imagens de crianças transformadas em autênticos esqueletos foi determinante para chamar atenção da ONU. Que negociou com o governo sírio a entrada da ajuda.
Segundo a RTP Notícias, de Portugal, a retirada das 300 pessoas nesta terça da localidade síria, cercada também pelo grupo xiita libanês Hezbolah, foi confirmada pelo diretor do Observatório sírio de Direitos Humanos, Rami Abderrahman.
A mesma fonte adiantou que há mais 400 pessoas doentes que necessitam de receber tratamento urgente e que esperam ser retiradas em breve. A maioria padece dos efeitos da fome e desnutrição no hospital em Madaya, segundo informou o chefe para os Assuntos Humanitários das Nações Unidas, Stephen O`Brien. A organização Médicos Sem Fronteiras (MSF) relatou que pelo menos 28 pessoas morreram de fome desde 1º de dezembro. Ontem, antes dos 60 caminhões chegarem a Madaya um menino de 9 anos e cinco homens com mais de 45 sucumbiram à fome.
Numa clínica mantida pelos Médicos Sem Fronteiras (MSF) foram encontradas pelo menos 250 pessoas em estado muito crítico por inanição – incluindo dez a necessitar de translado urgente para cuidados hospitalares mais sofisticados. Em declarações à BBC, o diretor operacional dos MSF, Brice de la Vigne, resumiu em duas palavras o cenário em Madaya: “Simplesmente horrível”.
A ajuda humanitária também chegou esta às localidades de Foua e Kefraya, na província de Idlib. São duas vilas de maioria xiita que estão cercadas pelas forças rebeldes que combatem o regime do presidente Assad, um coletivo que integra grupos extremistas como a Frente al-Nusra e Ahrar al-Sham. Estima-se que 20 mil pessoas estejam “retidas” naquelas vilas desde março de 2015.
Imagens transmitidas pelo canal de televisão Al-Manar, ligado ao Hezbollah, mostravam mulheres e crianças a chorar na rua, à espera da Cruz Vermelha. Os caminhões levaram mantimentos suficientes para alimentar 40 mil pessoas durante um mês – água, farinha, açúcar, arroz, azeite, sal, leite em pó para bebês – e outras provisões como agasalhos e cobertores, além de equipamento médico e cirúrgico.
“Esperávamos ansiosamente desde as 5h da manhã. A situação é desesperada e já era tempo de esta operação ser autorizada”, contou um ativista de Madaya, Abou Ammar, ao telefone com a Al-Jazira. “A operação deverá durar alguns dias. Este desenvolvimento é positivo, mas para o alívio do sofrimento de dezenas de milhares de pessoas, este tipo de distribuição não pode ser um acontecimento isolado, tem de acontecer com regularidade”, disse em comunicado a responsável pela delegação da Cruz Vermelha na Síria, Marianne Gasser.
O acesso das organizações internacionais a Madaya foi negociado com o Governo de Damasco e os representantes da coligação de oposição, as Nações Unidas e a Cruz Vermelha, na semana passada, após comoção mundial pelas fotos nas redes sociais. À Reuters, um médico local, Mohammed Yousef, disse que nos últimos dois meses 67 pessoas morreram de fome, ou por falta de tratamentos, a maior parte deles idosos, crianças e mulheres.