Políticos e ativistas catalães alvos de maior ataque de espionagem com Pegasus do mundo
Mais de 60 independentistas, entre eles atual presidente Pere Aragonés e seus três antecessores, foram espionados pelo softwere israelense, segundo a revista New Yorker
A New Yorker, na sua edição de hoje, revelou que mais de 60 políticos e ativistas pró-independência da Catalunha foram alvo de espionagem com o Pegasus e que este é o maior grupo de pessoas conhecido por ter sofrido tal intrusão. Intitulada “Como as Democracias Espionam seus Cidadãos”, com foco nos usos feitos por vários estados do softwere israelense, a revista anunciou a partir de apuração feita pela Citzen Lab, de Toronto, que entre os alvos da espionagem estão quatro presidentes da Generalitat. O atual, Pere Aragonès (Esquerda Republicana), e seus antecessores Quim Torra, Carles Puigdemont e Artur Mas, todos de Juntos por Catalunha (Junts). Na lista tambérm consta o nome da atual presidente do Parlamento da Catalunha, Laura Borràs (Junts) e do seu antecessor, Roger Torrent (ERC).
A notícia provocou indignação e a convocação de um evento nesta terça-feira na sede do Parlamento Europeu onde todas as pessoas espionadas estarão representadas. Coicidentemente, Puigdemont, atualmente eurodeputado, terá amanhã a primeira reunião na comissão do Parlamento Europeu que investiga a Pegasus, da qual ele é integrante.
Paralelamente, o advogado de Puigdemont, Gonzalo Boye, também alvo da espionagem, está preparando uma ação internacional em nome de dezenove pessoas espionadas ilegalmente.
ESPIONADOS – A reportagem começa explicando como o telefone do deputado da Esquerra Republicana (ERC), Jordi Solé, foi infectado poucas semanas antes dele substituir Oriol Junqueras (ex-vice-presidente da Catalunha) como membro do Parlamento Europeu, em junho de 2020. Meios de comunicação catalães especulam que os afetados estão convencidos que a espionagem partiu do governo espanhol. Pegasus é um software que é vendido apenas para governos.
Outra pessoa espionada foi Joan Matamala, irmão de Jami Matamala, uma das pessoas mais próximas do presidente Puigdemont no exílio. De acordo com o Citizen Lab, em fevereiro de 2021, o computador de Matamala teve uma infecção ativa usando um programa espião chamado Devils’ Tongue, desenvolvido pela Candiru, também uma empresa israelense, e fundada por ex-funcionários da NSO que são donos da Pegasus.
Da mesma forma, de acordo com o Citizen Lab, todos os deputados pró-independência foram espionados usando o método de infectar os dispositivos de pessoas ao redor das pessoas-alvo. No caso de Puigdemont, Joan Matamala, mas também a esposa do ex-presidente, a jornalista Marcela Topor, e o diretor do Gabinete do Presidente, Josep Lluís Alay. Os eurodeputados Clara Ponsatí, Toni Comín (Junts) e Diana Riba (ERC) também mencionados no início do artigo da The New Yorker.
Líderes de todos os partidos independentistas no parlamento catalão estão listados: Elsa Artadi, Josep Rius e Albert Batet (Junts), Sergi Sabrià, Meritxell Serret e Oriol Sagrera (ERC), Carles Riera, Albert Botran, David Fernàndez, Anna Gabriel (CUP), David Bonvehí e Ferran Bel (PDECat) e Marta Pascal (PNC), entre outros. Também o líder da esquerra abertzale Arnaldo Otegi, do País Basco, foi vítima de espionagem.
SOCIEDADE CIVIL – A revista também apurou que há um número importante de nomes espionados ligados à sociedade civil catalã. Por exemplo, a da presidente da Assembleia Nacional Catalã (ANC), Elisenda Paluzie, e do seu antecessor e integrante de Junts, Jordi Sànchez, certamente o primeiro a ter uma intrusão em seu dispositivo móvel, logo após a grande mobilização do Diada de 2015.
A organização cultural Òmnium também foi vítima da espionagem, articulada em volta da figura de Jordi Cuixart, ex-presidente da entidade, e seus colaboradores e contatos mais estreitos. É o caso do ex-vice-presidente da Òmnium, Marcel Mauri, uma das pessoas que mais teve o aparelho de celular aberto para links que abrem o portal para programas maliciosos. Também a jornalista Txell Bonet, esposa de Cuixart, e os membros do conselho de administração da entidade, Jordi Bosch e Elena Jiménez.
Também foram espionados Andreu Van den Eynde, advogado de ERC e de Oriol Junqueras no julgamento contra o processo independentista; Gonzalo Boye, que além de defensor de Puigdemont, tem como clientes Comín, Ponsatí e Lluís Puig; o ex-vice-presidente do parlamento Josep Costa, que também fez parte da equipe jurídica do presidente Puigdemont; e Jaume Alonso-Cuevillas, outro defensor que se destaca entre os líderes independentistas.
De acordo com o jornal digital Vilaweb, com a perseguição contra os independentistas, “o estado espanhol entrou na longa lista de estados que foram clientes da NSO e que usaram a Pegasus para espionar ativistas de direitos humanos, políticos da oposição, jornalistas, empresários, diplomatas, líderes sindicais“.
Segundo a apuração da revista New Yorker, há dezenas de milhares de afetados em todo o mundo. Um dos países com mais números de telefone espionados na lista de 50.000 números que o consórcio Forbidden Stories revelou no ano passado é o México, com mais de 15.000 números de jornalistas, políticos, líderes sindicais e mais críticos do governo.
Há também um grande número no Qatar, Emirados Árabes, Bahrein e Iemen. Entre eles muitos jornalistas da Índia, como Siddarth Varadarajan, fundador do jornal The Wire, um dos meios de comunicação que publicou as informações, e de alguns outros jornalistas de vários países, como Szabolcs Panyi, um investigador jornalista de Hong Kong que também publicou o vazamento.
Em declarações ao The Guardian, o governo de Hong Kong negou qualquer espionagem, mas a análise do telefone de Panyi mostrou que o aparelho foi infectado várias vezes durante setembro de 2019, logo após ter solicitado declarações às autoridades governamentais. Além disso, o The Guardian publicou que o governo de Viktor Orbán em Hungria usou o programa com o propósito de atingir defensores, oponentes políticos e jornalistas. o que também foi negado.
Análises da Anistia Internacional também descobriram que o programa foi instalado nos celulares da esposa e da namorada do jornalista do The Washington Post Jamal Khaixoggi, assassinado dentro do consulado saudita em Istambul em outubro de 2018 por um comando que viajou expressamente da Arábia Saudita, supostamente com a intenção de convencê-lo a retornar ao país, já que vivia exilado nas Unidades Estatais.
PROGRAMA MALICIOSO – O chamado software “malicioso” só pode ser adquirido por governos estaduais ou forças de segurança. Aproveitando vulnerabilidades nos sistemas de segurança do telefone, é introduzido para espionar todo o seu conteúdo. Isso pode ser feito através de uma chamada que nem precisa ser atendida – às vezes não é recebida – com um link enviado por SMS, um e-mail ou mecanismos semelhantes. A técnica mais comum é enviar uma mensagem oculta ao alvo para persuadi-lo a confiar em você e clicar no link que ele lhe enviou.
Uma vez dentro do dispositivo, o Pegasus tem a capacidade não só de acessar o aplicativo através do qual é ativado, mas também de ativar secretamente o microfone e a câmera, ou acessar os arquivos, mais aplicativos e redes sociais. Quando o processo de espionagem começa, o servidor envia as informações para os clientes.