Giro pelo mundo (II)

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Por Cesar Vanucci *

Sente-se o cheiro do esterco do diabo…”.
(Papa Francisco)

As palavras e os posicionamentos de Francisco continuam encantando o mundo. E, certeiramente, desagradando parcelas infinitamente minoritárias, embora prodigamente beneficiadas por uma ordem de coisas tremendamente injusta, que não se apoquentam nem um tiquinho com as escandalosas mazelas sociais espalhadas por tudo quanto é canto do planeta.

Em seu giro recente por países da América do Sul, o grande pontífice, uma vocação de estadista inigualável na paisagem humana contemporânea, fez ecoar novamente, com poderoso impacto mundial, sua empolgante mensagem pastoral em favor de ”melhores caminhos para superar as graves situações de injustiça de que padecem os excluídos em todas as partes.”

Voltou o olhar paternal e conselheiro para questões essenciais, colocando o dedo com precisão nas feridas que tornam o sofrimento tão dolorido para bilhões de criaturas. Suas, extraídas dos pronunciamentos feitos durante as visitas ao Equador, Bolívia e Paraguai, as palavras alinhadas abaixo:
“Digamo-lo sem medo: precisamos e queremos uma mudança; uma mudança real, uma mudança de estruturas. Este sistema é insuportável: não o suportam os povos, nem sequer o suporta a Terra, a irmã e Mãe Terra, como dizia São Francisco.”
“A mudança desejada por muitos, para ser integral deve abranger também o espírito. Ela é redentora. É dela que precisamos. (…) Verifiquei que há uma expectativa, uma busca forte, um anseio de mudança em todos os povos do mundo. Mesmo dentro da minoria (…) que pensa sair beneficiada deste sistema, reina a insatisfação e, sobretudo, a tristeza.”
“Por trás de tanto sofrimento, tanta morte e destruição, sente-se o cheiro do esterco do diabo: reina a ambição desenfreada de dinheiro. O serviço ao bem comum fica em segundo plano.”
“Quando o capital se torna um ídolo e dirige as opções dos seres humanos, quando a avidez do dinheiro domina todo o sistema socioeconômico, arruína a sociedade, condena o homem, transforma-o em escravo, destrói a fraternidade, faz lutar povo contra povo e até, como vemos, põe em risco esta nossa casa comum, a irmã e Mãe Terra.”
Palavras de Francisco, o Papa iluminado.

Palavras e atos
Mantenho em meus arquivos frases recentes de dirigentes políticos europeus falando da necessidade de mudanças do modelo econômico perverso que aí está. As manifestações derivam do reconhecimento de que as populações da zona do euro vêm sendo – não apenas na Grécia – submetidas a pesadas provações, com ressonâncias funestas noutros cantos do mundo, em função de equivocadas teses de austeridade traçadas pela neo fajutice global.

O presidente francês François Hollande assumiu a dianteira das críticas ao receituário vigente. Fê-lo com inusitada veemência. Seus pronunciamentos desencadearam prontas e favoráveis reações.
Da Itália chegou o desabafo do dirigente político Enrico Letta: “A Itália está morrendo graças a este programa de austeridade”.
Cristine Lagarde, do Fundo Monetário Internacional, seguiu o mesmo diapasão: “Está havendo um erro de apreciação”.
José Durano Barroso, outro dirigente da Comissão Europeia, não deixou por menos: “Esta receita de austeridade atingiu seus limites.”
E até mesmo a chefe do governo alemão, Ângela Merkel, comprometida mais do que qualquer outro dirigente da chamada Eurolandia com a “terapia” dos remédios amargos que ameaçam combalidos pacientes, muitos deles quase em estado terminal, não se furtou ao dever moral de colocar, desta feita, o dedo na ferida: “Agora, precisamos pensar também em crescimento.”
Quem também, lá em Roma, marcou posição vigorosa, outra vez, em favor de uma metamorfose na vida econômica, com palavras repletas (como sempre) de sabedoria foi ele, o Papa Francisco. Eis o que disse: “Vocês se preocupam com os bancos, enquanto milhões e milhões morrem de fome. Quando caem os investimentos nos bancos parece que houve uma tragédia. É contra essa mentalidade que a Igreja tem que combater.”

Coisa curiosa: tão lúcidos argumentos, sobretudo os de Francisco, não encontram eco merecido no noticiário nosso de cada dia. Por que será?

* O jornalista Cesar Vanucci (cantonius1@yahoo.com.br) é colaborador do Blog Mundo Afora

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